quarta-feira, 29 de maio de 2013

Não se passa nada...

Não se passa nada. Não abraço as árvores com amor universal, não sinto raiva por sentir os meus pés sobre mim, não me atrapalho com o equilíbrio precário dos pasos dos outros, não me sinto cavalo sem freio e sem direcção, com trote violento e coices que só a mim me acertam.

Não se passa nada. Não me sinto presa na minha ausência de vida, não me alegro pateta com SMS em cascata, não me esgoto nas horas de vício com fumo ou com net, não lamento a falta de amor e de ódio, de lentes bem focadas no presente ou de risos sem razão, mas com fundamento.

Não se passa nada. Não me altera o mau cheiro do espírito das gentes, a alienação nos bancos do metro, onde há caras, mas raramente se vêem corações. Não me perturbam nada os passos apressados para lado nenhum, a falta de oxigénio no quotidiano, a falta de fibra no momento do combate, as desculpas cobardes e filosóficas para a inércia, os momentos zen que não passam de paralisia e a serenidade que não passa de Buda de 3ª categoria injectado no 3º olho.

Não se passa nada. Não me indigna que se passem atestados de estupidez constante a quem aspira a algo mais que crédito ao consumo, salário à medida e conforto mundano, ou que não se ponham os olhos no céu em vez de juntar a cabeça às patas no chão.

Não se passa nada, só eu é que me passo de vez em quando.



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